“O que está travando o crescimento do Estado”: essa é uma das chamadas de capa da edição dominical de Zero Hora (01/06/2014). O leitor desavisado se perguntará: a economia do Rio Grande do Sul está travada?
Longe disso, em 2013 cresceu acima da média nacional e os primeiros números de 2014 apontam na mesma direção. Na semana passada, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revisou os números que tinha divulgado sobre o crescimento da indústria gaúcha no passado.
Segundo o IBGE, a produção física industrial do Rio Grande do Sul cresceu 7,4% em 2013, número superior aos 6,8% que tinham sido anunciados anteriormente pelo instituto. O resultado significa que o RS cresceu mais do que o dobro dos Estados mais industrializados do país que, na ordem, são: São Paulo (2,3%), Minas Gerais (0,1%), Paraná (3,2%) e Rio de Janeiro (-0,3%)
O índice criado pela Zero Hora em parceria com a PUC-RS toma 2012 como o último ano da série calculada, desconsiderando o ótimo desempenho da economia do Estado em 2013 e nos primeiros meses de 2014. “Crescer ou se acomodar? Eis a questão” destaca o jornal em outro título, repetindo formulação feita dias atrás pelo empresário Jorge Gerdau, em uma entrevista publicada no mesmo jornal. Para Gerdau, o RS até vai bem, mas estaria “acomodado”. Na entrevista, entre outras coisas, Gerdau diz que “os gaúchos estão felizes, mas por acomodação”, o que ele qualifica como algo terrível:
“(…) O terrível é que, se você pergunta ao cidadão médio do Rio Grande do Sul, verá que ele está feliz. Não comparamos direito as coisas: se olharmos a logística de São Paulo e a nossa, é irritante. E como São Paulo fez? Com concessões [ao setor privado], mas nós as suspendemos”. Ao falar da “acomodação gaúcha”, o empresário também ironiza “o churrasquinho do final de semana e um baita desafio que é o Gre-Nal”, apontando-os como ingredientes dessa acomodação.
Após a entrevista de Gerdau, Zero Hora repete a dose e anuncia o seu próprio indicador que desconsidera o melhor desempenho da economia gaúcha nos últimos anos. Assim, apesar de estar crescendo acima da média nacional, a economia do Estado é apontada como “travada” e “acomodada”.
“Diante de uma grande massa de dados, você consegue tirar diferentes resultados, resultados bons e outros não tão bons”, comenta Flávio Fligenspan, professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Neste índice divulgado pela Zero Hora, se tomarmos o ano de 2008 para cá, observa Fligenspan, obtemos resultados diferentes dos anunciados. Por que 2008? É o ano do início da crise internacional e um período relevante para se fazer uma avaliação do desempenho da economia. Pois bem, se tomamos 2008 para cá, vemos pelos próprios números do IRS que o Rio Grande do Sul vem crescendo acima da média nacional e cresceu mais que São Paulo, o Estado mais industrializado do país. Zero Hora prefere fazer outro recorte temporal (entre 2005 e 2012) para justificar a tese do “travamento” e da “acomodação”.
Fligenspan também relativiza a tese defendida por ZH de que o Rio Grande do Sul tem perdido participação no PIB nacional. Todos os Estados que tinham economias mais pujantes tradicionalmente, como São Paulo e Rio Grande do Sul, perderam espaço na composição do PIB nacional em função do grande crescimento de Estados que eram mais pobres. Em uma nota divulgada na última sexta-feira (30), o governo gaúcho faz uma comparação entre o desempenho das indústrias do RS e do Ceará:
“O Rio Grande do Sul só foi superado pelo Ceará, cuja participação no total da indústria do Brasil é de apenas 1,4% e avançou 11,3% em 2013. A participação da indústria cearense no parque industrial brasileiro, porém, é quase residual, de 1,4%, o que reduz o impacto do crescimento, tanto em nível nacional quanto local. O Rio Grande do Sul, ao contrário, responde por 7,7% da indústria brasileira, o que torna o resultado de 2013 altamente significativo no contexto da economia gaúcha e do país”.
Segundo seus criadores, o IRS se diferencia de outros índices do gênero pelas seguintes características: “os dados são oficiais, de fácil acesso e de fácil compreensão; a fórmula é simples com foco na vida real: mede o impacto nas pessoas, não nas instituições ou no poder público”. A julgar pela formulação, para os elaboradores do IRS, instituições e poder público não fazem parte da vida real e não tem a ver com a vida das pessoas.
As escolhas feitas pelos últimos governos, que integram a faixa temporal recortada pelo índice da RBS, tampouco parecem fazer parte da vida real, já que não são consideradas muito menos analisadas numa pesquisa que pretende fazer um raio-x do desenvolvimento humano no Estado. O governo de Yeda Crusius, por exemplo, prometeu colocar a economia do Rio Grande do Sul nos eixos com o déficit zero e um choque de gestão. Essas escolhas, que foram apoiadas editorialmente por veículos da RBS, tiveram algo a ver com a vida das pessoas ou fizeram parte da vida real, influenciando os indicadores de desenvolvimento humano do Estado?
Marco Weissheimer
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