quinta-feira, 20 de novembro de 2014

O Brasil mudou e a Petrobras também precisava mudar…

Com a Operação Lava Jato nada mais será como antes… Ainda bem.


Tem muita gente tola nesse país que compra as ideias da imprensa e usa em seus comentários, ou por ignorância ou por falta de escrúpulos, sai dizendo coisas como se fosse o maior especialista do mundo sobre a área de petróleo. Tenho visto isso aos montes agora por conta da Operação Lava Jato da Polícia Federal e sua investigação na Petrobras.
Uma empresa de petróleo como a Petrobras não é uma empresa de fundo de quintal que pode ser analisada de forma simplista, sem levar em conta as complexidades do negócio do petróleo que envolve questões técnicas muito sofisticadas. Além disso, a própria história da exploração do petróleo no Brasil  mostra que sempre houve conflito com forças internacionais que não queriam que tivéssemos êxito nessa área.
A Petrobras foi criada na década de 50 no século passado no meio de um conflito internacional onde a astúcia de Getúlio Vargas ajudou para que a oposição política que ele tinha na época votasse a lei que ele queria que fosse votada, a Lei do Petróleo. Sabemos o que aconteceu depois e Getúlio se matou para minar as forças políticas que eram contra a Petrobras.
As lutas pelo petróleo e a soberania do Brasil através de sua produção nortearam a criação da Petrobras, mas, a partir do momento que ela foi criada, outras lutas foram se dando e o combate sendo feito.
Sem tecnologia que as demais empresas de petróleo que estavam no país já tinham, a Petrobras teve que contar com o conhecimento de técnicos internacionais, muitos das próprias empresas que não queriam o sucesso da Petrobras. Por conta da defasagem técnica dos brasileiros, em 1963 foi criado o Centro de Pesquisas Leopoldo Américo Miguez de Mello (CENPES) no Rio de Janeiro que se tornou o maior polo de pesquisas do hemisfério sul. Foi ali que a tecnologia para exploração de petróleo em águas profundas foi pesquisada, elaborada e melhorada continuamente fazendo com que a Petrobras se tornasse se tornasse detentora dessa tecnologia e fonte inesgotável de conhecimento científico e tecnológico como é hoje.
Um técnico do sistema Petrobras seja ele de qualquer atividade, não é um profissional qualquer.  São anos de investimentos em estudos e conhecimento através de cursos e treinamentos de vários tipos. Ser funcionário do sistema Petrobras significa ter acesso a um mundo de informações e experiências compatíveis com o grandioso porte de suas empresas.
Por outro lado, em empresas como essas,  com as complexidades que possuem e sua vasta burocracia organizacional com inúmeras superintendências, gerências, setores e órgãos de pesquisa, produção, exploração, desenvolvimento de produtos, comercialização, onde a tecnologia e a ciência estão presentes de forma dinâmica e constante, é temerário dizer que é possível conhecer tudo que acontece. Por que?
Além da própria engrenagem gigantesca e dinâmica, o sistema Petrobras se constituiu com a cara da sociedade brasileira. Os problemas e a ideologia dominante na sociedade são características marcantes na gestão dessas empresas.
Assim como o Brasil não tinha a integração dos sistemas de informação do Governo até 2003, também nas empresas do sistema Petrobras isso não acontecia. A gestão da Petrobras se mantinha como pequenos, médios e grandes feudos, onde seus executivos tomavam decisões sem se importar muito em como a sua decisão iria interferir em outros setores da empresa. A informatização se baseava no que cada setor entendia como sendo importante para ele. Assim, os sistemas além de não serem integrados eram precários e submetidos as ordens dos executivos que chefiavam as áreas. Era assim na Petrobras Distribuidora, a empresa que trabalhei e não era muito diferente o que acontecia na Petróleo Brasileiro S.A e nas outras subsidiár
E além de tudo isso os funcionários eram expostos as políticas defendidas pela Direção da empresa, que por sua vez eram propagadas a partir de uma forma de pensar, uma ideologia, uma forma de ver o mundo que dependendo do Governo que estava no poder permeava sua cultura.
Por quantos anos a ideologia da ditadura militar, dos partidos de direita e posteriormente do PSDB vigoraram dentro do sistema Petrobras? Por 40 anos. Havia poucas diferenças entre eles. Quando os Governos do PT entraram o modus operandi já estava instalado. Não é a toa que o Ministério Público e a Polícia Federal esclareceram que o esquema desbaratado pela Operação Lava Jato já funcionava há pelo menos 15 anos. E a coisa deve ter sido ainda mais antiga. É que não já não há formas de se descobrir isso. Muita gente já morreu e como eu já disse os sistemas da época não guardam lembranças nem memórias do que passou…
Durante todo esse tempo o que aconteceu?  Todos sabiam e ninguém sabia. O medo imperava. Para se ter uma ideia de como era forte essa cultura, como exemplo, conto um caso ocorrido em 1999 quando um diretor tentou, a título de diminuir custos, retirar de meu setor uma maquina copiadora que fazia cópia dos pedidos de combustível de várias regiões do Brasil feitos por fax e que precisávamos ter cópia para documentar o processo para possíveis auditorias. Reclamei com meu gerente e disse que ele tinha que ir ao diretor e dizer que o nosso setor não poderia dispensar a máquina. Sabe o que ele me respondeu? Não posso fazer nada, Diretor é Deus!!!
Qualquer semelhança com o que vimos nos últimos dias em relação a um determinado juiz não é mera coincidência. Presidente e Diretor na Petrobras sempre mandou e desmandou e os Superintendentes e Gerentes Executivos não fugiam a essa norma em relação aos pobres mortais empregados. Envolvidos politicamente com vários políticos de partidos de direita sempre fizeram o que queriam e o que eles mandavam.
Aliás, foi esse mesmo gerente que uma certa vez sem querer me disse que a empresa terceirizada que prestava serviços na área de atendimento para nós tinha um sócio muito importante: José Sarney. Confesso que na época ainda era muito ingênua e não acreditei.
Quem analisa a Operação Lava Jato e os contornos que ela tem sem levar em conta tudo isso faz uma análise tosca e simplória do que significa essa operação e tudo que até então estamos vendo no Brasil. A política permeia tudo, e quem não se tocou disso ainda é tolo ou se faz de tolo.
Renato Duque era líder do governo do PSDB até o final da era FHC, quando, após uma briga com Tasso Jereissati, mudou-se para o PMDB de Renan. Quem o indicou portanto? O PMDB. Mas, o que a mídia faz. Esconde o passado de Duque como se ele não existisse. Aí dão um jeito de dizer que ele foi indicado por José Dirceu, para ligá-lo ao PT e aí falarem mais uma vez de mensalão. É tão mórbido e tão inverossímil quanto pensar que Renan, cacique do PMDB, colocou um ex-tucano na Petrobrás para desviar dinheiro para o PT. Ridículo.
Aliás, a imprensa já havia feito isso com o Paulo Roberto Costa, funcionário da Petrobras desde os anos 70, que todos sabemos é indicado pelo Cacique do PP (ex-PFL, ex-Arena), Francisco Dornelles, que vem a ser primo de Aécio Neves do PSDB. A imprensa distorce tudo para tentar enfiar as mazelas da República, que acontecem por falta de um sistema político mais eficiente, que os mesmos políticos não aceitam mudar, no colo do PT.
Não é de hoje que a imprensa ajuda a direita e a elite brasileira jogando contra o país. Aliás, isso é tão antigo que Arthur Bernardes no século passado já dizia:
“A imprensa, em tese, vive ao serviço dos trustes do petróleo. O jornal é uma empresa que se funda para explorar a indústria de publicidade, e tem a publicidade quem pode pagá-la. A nação fica prejudicada na defesa de suas riquezas naturais porque nós que a defendemos contamos com o silêncio da imprensa (..) Por isso todo dia os trustes mandam anunciar que o Brasil precisa desenvolver-se, que precisamos do auxílio do capital estrangeiro etc. São os próprios interessados que assim agem para criar entre nós uma falsa opinião pública.
Mas, cheguei a conclusão de que a imprensa e muitos que vociferam tolices por aí estão certos numa coisa. Os Governos do PT são culpados. E registro sua culpa como a minha e de muitos outros também que de forma indireta fomos cúmplices disso, porque os apoiamos.
Lula e Dilma não deveriam ter confiado em vários de seus aliados. Não deveriam ter sido ingênuos de ceder às chantagens de outros partidos. Não deveriam ter procurado a governabilidade dentro do sistema político vigente. Não deveriam ter sido tão republicanos e democráticos e aceitado sugestões de técnicos e juristas com experiência de anos na burocracia estatal e governamental. Não deveriam ter feito o possível e o impossível para governar uma máquina corrompida e viciada em nome de um projeto de mudança para o povo brasileiro. Não deveriam ter insistido em governar para tirar o Brasil da miséria conjuntural e estrutural em que vivia.
Agora, vejam só que loucura, estamos a ponto de poder acabar com a impunidade que existia até então. Vivemos num país onde é possível conhecer quanto gastam e quanto investem nossas estatais após a criação de sistemas de informação e leis de transparência por esse Governo. Sabemos quanto ganham certas pessoas que se diziam honestas e descobrimos que são mentirosas e privilegiadas. A Polícia Federal e o Ministério Público tem independência para trabalhar, punir pessoas e fazer voltar o dinheiro de nossos impostos aos cofres públicos. A Presidência da República dá respaldo a uma Controladoria Geral para que previna a corrupção no Governo.  A Petrobras está sendo investigada e outras empresas também. Nossa! Tanta coisa em tão pouco tempo…
Realmente, os Governos do PT foram culpados de muita coisa. Lula e Dilma não deveriam ter mudado o Brasil e nós não deveríamos ter votado neles. Assim, tudo poderia continuar como era antes, e, nenhum político de nenhum partido estaria preocupado e continuaria fazendo o que sempre fizeram. A farra nas estatais continuaria.
E a Petrobras? Estaria privatizada e não teríamos o Pré Sal. Mas, quem disse que isso é importante? Talvez não para alguns. Mas, para mim e para todos que votamos no PT é sim. O Brasil mudou e a Petrobras também precisava mudar. Com a Operação Lava Jato nada mais será como antes… Ainda bem.

Por Ligia Deslandes, Presidente do SITRAMICO - Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Minérios e Derivados de Petróleo do Estado do Rio de Janeiro

Tags:

Nenhum comentário:

Postar um comentário